Estas são pequenas histórias, contos, ou, para ser mais modesto, se quiserem, uns simples escritos, se não desabafos. Por que as designo como coisa usada, que já passou por mais de um dono? Se tiverem um tempinho para escutar, eu explico. Começou assim: há coisa de uns 30 anos eu resolvi testar minha capacidade de ir além dos textos e relatos de natureza mais técnica ou circunstancial que até então representavam quase toda a minha produção escrita e foi assim que esbarrei com um personagem de Guimarães Rosa – desde então, ou mesmo antes, meu autor referencial – presente no livro Tutaméia, chamado João Porém, ao qual se adicionava o qualificativo: o criador de perus. Era um tipo humilde, morador de grotões, meio abilolado, sem outro derivativo na vida que não fosse sua criação de tais aves. Um personagem, aliás, em sintonia com outros tipos de pessoas alheias aos padrões dito normais da sociedade, prestigiados por Rosa, entre os quais se incluem, por exemplo, os Catrumanos (de Grande Sertão Veredas); o homem que abandona sua vida normal para passar o resto de seus dias em uma canoa (A Terceira Margem do Rio); a menina que tinha visões (A menina de lá); o homem recluso conhecido como Cara de Bronze (No Urubuquaquá, no Pinhém); a filha e a mãe de Soroco (Primeiras Histórias), além de muitos outros. E foi assim que resolvi dar continuidade à saga do criador de perus, com todo respeito pelo Rosa e mais do que isso, acreditem, querendo homenageá-lo. Adicionei, então, uma companheira ao pobre peruzeiro, trazendo também mais detalhes a sua pobre vida roceira, até sua morte no final. Daí nasceu Continuação, que faz parte desta pequena coletânea, como os leitores verificarão nas páginas seguintes. O fato é que devo ter tomado gosto por tal coisa, embora a princípio não de forma assumida, até que em tempos mais recentes resolvi praticar tal arroubo como verdadeira missão, surgindo daí a dúzia de escritos que ora trago à luz.
Continuar lendo “Histórias de Segunda Mão”