Uma viagem e tanto…

A viagem de que se fala aqui, na verdade, era para ser outra. Transcorreria antes do grande cataclisma mundial e nacional que foi a pandemia de Covid e reuniria apenas a família Camarotti, representada por Henriqueta, Helaine e Alexandre. Mas o mundo virou de pernas pro ar, dois anos inteiros se passaram e ela acabou acontecendo com novos personagens adicionados: Flavio Goulart e Maria Íris Guimarães. Alexandre deixou para outra vez. Assim é que nestas páginas eu, Flavio Goulart, narro minhas percepções sobre esta viagem, sob a forma de crônicas. O ideal seria que cada uma das demais viajantes deixasse também suas impressões, pois o que aqui vai é apenas uma visão individual. O narrador, admitamos, não é dos melhores, mas dos mais expostos à galhofa, como disse Drummond a respeito de si mesmo, mas é o que se oferece para o momento. Intitulei estes escritos de Crônicas Portuguesas. Espero que os leitores também apreciem, já que eu gostei muito de ter escrito…

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Crônicas do Bom Viajar

Esta foi uma viagem a dois, para dois e entre dois. As origens de sua realização se situam antes, muito antes de ela ter ocorrido de fato. Mas por que Portugal? Por um lado, pela ascendência portuguesa de Keta. Por outro, pelo meu amor ao país onde também tenho raízes, embora mais remotas. Mais um lado foi trazido pela generosidade de Keta, minha mulher, em pensar que eu poderia guiar uma viagem que ela ainda não havia realizado, apesar de conhecer Portugal de outras passagens pelo país. Uma viagem, acima de tudo, amorosa, na qual paisagens, lugares e nossas duas pessoas estiveram entrelaçados todo o tempo, em clima intenso de conexão entre a construção humana, a paisagem, a amorosidade e o sagrado. E assim decorreram as semanas iniciais em Braga, depois os dias em Marselha e Paris, para arrematar com mais um tempo, de novo em Braga e depois Lisboa. Pequenos contratempos, como o furto de um celular e de cartões de crédito não tiraram o brilho da viagem nem a nossa alegria de estarmos juntos. Pelo contrário, fizemos valer com brilho o adágio, aquele, que fala do suporte mútuo na alegria e na tristeza, levados então por nós até as derradeiras consequências. Foram quase 60 dias juntos, 24 horas por dia, sorvendo cada hora e cada minuto, conhecendo coisas e lugares novos e diferentes praticamente a cada dia, mas principalmente nos (re) conhecendo, em um estado de permanente gratidão ao destino por nos ter proporcionado, depois de 12 anos afastados, um reencontro tão luminoso. Esta viagem foi um marco para nós. Assim foi, assim será. Cabe lembrar Saramago: O fim duma viagem é apenas o começo doutra […] É preciso voltar aos passos que foram dados, para os repetir, e traçar caminhos novos ao lado deles. É preciso recomeçar a viagem. Sempre. O viajante volta já. Nossa história juntos mostra também tais desígnios e por isso fazemos disso palavras também nossas. E, principalmente, que tenhamos muita disposição e muita saúde para as outras viagens que nossa vida, juntos, haverá de proporcionar…

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Entre Sertões: de Brasília ao São Francisco e ao Jequitinhonha

 (Estrelando: Keta, Flavio, Iris e Luiz Gonzaga)

Com toda felicidade e já com saudades dos excelentes dias passados junto a tão amáveis companhias, eu, Flavio, principio este relato. Parafraseando Guimarães Rosa, aliás nosso companheiro constante nesses dias, esta foi uma viagem inventada (e realizada) no feliz. Não posso dizer que houve muita preparação, pelo menos coletiva, pois meus companheiros delegaram, com muita honra para mim, as atribuições de planejador, guia e escriba, além de condutor. E assim nos juntamos, Keta Camarotti, Iris Guimarães, Luiz Gonzaga e eu para este giro pelos Sertões de Minas, sem desprezar seu correspondente goiano, entre 5 e 11 de maio de 2023.

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Chapada dos Veadeiros

Aqui é a Chapada dos Veadeiros. Ou melhor, estamos em um dos muitos vales que foram abertos pela força das águas que correram através dos tempos a partir das terras mais altas, acima dos mil metros de altitude, como é o caso daquelas onde se hoje assenta a cidade de Alto Paraiso. Um dia, há mais de cem milhões de anos, tudo isso foi o fundo de um grande oceano. Quando as imensas placas que formam a superfície da terra se moveram, a água de tal mar simplesmente fez o que ela sempre faz, agiu sob a força de gravidade e rolou para as partes mais baixas. No seu caminho, abriu vales como este, do ribeirão São Bartolomeu, que corre para o rio Paranã, que corre para o Tocantins, que corre para o Amazonas, e para o mar, desaguando na Bahia de Guamá, onde está a cidade de Belém.

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No Mato-Dentro

Para sairmos da grande cidade é preciso trilhar seus tristes caminhos de periferia, lixo jogado nas ruas e o povo pobre nos pontos de ônibus. Mas lá na frente, mal e mal vislumbradas, as montanhas já nos auguram, em pálido azul que se confunde com o cinzento, a passagem por mais aprazíveis lugares. Em marcha sinuosa e intercalada pelos quebra-molas, passagens de linha de ferro e semáforos, ladeando as grandes filas de moradias toscas e sem reboco, vamos deixando para trás essa “mancha urbana” – coisa que aqui é sempre uma “mancha”, pelo menos em relação ao destino que esta gente deveria ter, mas não tem. Mas é ir em frente – fazer o quê? E assim alcançamos a velha cidade, vizinha quase emendada à metrópole adjacente, herdando dela e até piorando o que de mal possa haver. Mas em todo caso, além da ponte do rio histórico, alguma coisa mais bela se anuncia e logo se confirma, mas se reduz a uma única rua, só, aquela fileira de casarões, seus telhados sobranceiros, uma ou outra igreja ou capela, o que sobrou de um chafariz ou de um aqueduto. As placas comerciais escandalosas, anunciando negócios e mercadorias, em barafunda, meio que estragam ou contaminam tudo. Mas pelo menos os quintais ainda ostentam suas mangueiras centenárias, neste momento em florada, cujo cheiro é possível sentir mesmo dentro do carro. Continuar lendo “No Mato-Dentro”

Oitenta dias em Portugal

img_0014Oitenta dias longe do Brasil. Mais do que isso, distante dos filhos, netos e
outras pessoas queridas; de minha casa, meus cachorros, minha cama e
meu banheiro. Oitenta dias, o mesmo tempo que Phileas Fogg, o personagem de Jules Verne, levou para dar a volta ao mundo. Eu estive num
mundo bem pequeno, mas mesmo assim muito rico e proveitoso. Mas terá
valido a pena? – é sempre caso de se perguntar. Creio que foi um saldo
positivo e me disponho aqui a demonstrar isso, tentando não deixar de lado
alguma coisa que tenha que ser debitada em tal conta. Continuar lendo “Oitenta dias em Portugal”

Voyage au Canada

No final dos anos 80, através de duas amigas, Sonia Terra e Eleonor Conill, eu comecei a prestar atenção no que acontecia no Canadá em matéria de saúde. Eu fazia mestrado na ENSP, tinha intenção de escrever uma dissertação sobre a construção do SUS, sendo que a experiência canadense, já com uma década de consolidação, me parecia sob medida para aprender mais sobre tal objeto.  … Continuar lendo Voyage au Canada

De Brasília ao Rio São Francisco e mais além: um roteiro não convencional

O rio São Francisco não banha Brasília. Nem passa perto. Mas nem por isso podemos considerá-lo como um estranho em nossa cidade. Primeiro, porque se nos movermos umas poucas dezenas de quilômetros para o Leste, já estaremos em sua bacia. O Rio Preto, que nasce no DF corre para o São Francisco. O município de Formosa já é totalmente são – franciscano e, aliás, algumas … Continuar lendo De Brasília ao Rio São Francisco e mais além: um roteiro não convencional

Viagem a Portugal (VI): do Minho ao Alentejo

O plano, no princípio, era seguir rumo ao Norte, à Galícia e Santiago de Compostela. Mas Ponte de Lima foi mais sedutora, e por ali ficamos. Até porque aquelas montanhas a nordeste nos atraiam. E por elas fomos. Caminhos tranqüilos, que acompanham o curso-acima do rio Lima. Natureza exuberante, às vezes até com um toque tropical. Cidades grandes não há, mas é raro andar mais … Continuar lendo Viagem a Portugal (VI): do Minho ao Alentejo