Amigo, devo dizer que fico realmente preocupado quando vejo pessoas progressistas como você (para não dizer de esquerda, pois este termo está muito desgastado) tentarem justificar os atos de terror perpetrados por fiéis do islamismo em várias partes do mundo, como uma resposta compreensível, dadas as muitas maldades que as chamadas potências ocidentais fizeram contra eles ao longo dos séculos.
Acho que não tem nada de compreensível nem de justificável nesses atentados. Não é necessário ter parentes mortos no Bataclan de Paris, na Universidade do Kenia, nas areias do Sinai, nos cafundós da Nigéria ou sei lá onde mais para dizer isso. Precisa?
Estes fanáticos do auto proclamado “Estado Islâmico”, e seus correspondentes, na melhor das hipóteses têm sido classificados como seguidores radicais de certas passagens do Corão, de fundo milenarista, que antevem o fim do mundo para breve, sentindo-se assim na obrigação moral e religiosa de antecipá-lo. Na pior das hipóteses eles não passariam, mais do que fanáticos, de delinqüentes, psicopatas, assassinos.
O número de adjetivos no parágrafo anterior parece excessivo, mas essa gente pede muito mais.
Você condena estes atos, bem o sei, mas vê neles uma reação compreensível, talvez até justa. Eu discordo! O terrorismo islâmico é de fundo cultural, está impregnado nas civilizações que cresceram e frutificaram à sombra do Corão. Em toda parte e em toda a história deles o que se vê é: xiitas x sunitas; clericais x seculares; persas x árabes; “nós” x “os outros”; “fiéis” x “infiéis”. Eles se constroem, no combate, na perseguição aos inimigos da fé, na desconfiança em relação a quem lhes é diferente. E como matam em nome disso!
O mundo ocidental já cometeu e continua cometendo muitas barbaridades, não o defendo. Mas o terrorismo islâmico é muito mais fruto de uma cultura perversa do que das intervenções colonialistas. O EI não precisa de bombas americanas ou russas para exercer seu especial primado de violência delinquente. Neste ponto, seria interessante indagar quem matou mais até hoje: as lutas tribais islâmicas ou as invasões ocidentais?
Cabe indagar: que nação islâmica, onde fé e política são inseparáveis, respeita direitos humanos? Onde as mulheres são tratadas como seres portadores de direitos? Onde a liberdade de expressão e crença é respeitada? E mais: em quais dos países islâmicos, entre os quais estão os mais ricos do mundo, houve distribuição de riqueza, mesmo mínima? O Irã é considerado o mais democrático dos países islâmicos – dá pra imaginar o resto?
Amigo, acorda: o islamismo, enquanto política ou religião é puramente atraso e fonte de instabilidade no mundo! Não cabe no ideário de quem se intitula progressista, ou de esquerda, defender de alguma forma este regime político-religioso.
O islamismo não precisa dos “demônios” do Ocidente (cristão, judaico, capitalista) para ser violento. Ele é intrinsecamente violento. Não é a toa que o Corão oferece aos “mártires” um paraíso onde dezenas de virgens lhes esperarão para satisfazê-los sexualmente? “Mártir”, para esta gente, é aquele que morre levando consigo o maior número possível de infiéis. Fico em dúvida sobre o que tal paraíso oferecerá às mulheres que se martirizarem também…
Aqui entre nós, a civilização ocidental tão odiada por eles, ainda é mais aceitável do que aquela que se desenvolveu debaixo das barbas do Profeta… Se é que aquilo pode ser chamado de “civilização”… Mesmo que lado de cá tenha produzido um Hitler, um Stalin, um Milosevic, além da inquisição e do consumismo desenfreado, entre outras mazelas, foi debaixo da cultura do Ocidente que foi possível amealhar para a Humanidade uma série de conquistas, como os direitos femininos, a separação entre Religião e Estado, o estado de bem estar social, os direitos humanos e coletivos, a música de Beethoven, o respeito às crenças e a liberdade de expressão. Os nossos tiranos, pelo menos podem ser considerados exceções; os deles (Saddam, Al Assad, Mubarak, Gadafi), são regra.
Entre os muitos erros cometidos pelo Ocidente está, sem dúvida, a partição arbitrária dos territórios do Oriente Médio. Mas eles já se matavam antes disso… Mais recentemente, as desastradas invasões do Afeganistão e do Iraque e a intervenção militar “pelo alto”, na Síria. Tudo isso só tem piorado as coisas por lá, admito. Mas não é a semente, a raiz da violência que ali campeia, em nome de Alá… Aliás, se há uma lição que o Ocidente já devia ter aprendido, em sua faina de “consertar” o Oriente Médio é a seguinte: o “santo remédio” da democracia não funciona ali. Pelo contrário, provoca prurido, vômitos, mal estar. É no quase-caos das lutas tribais que eles encontram seu equilíbrio, Melhor deixá-los entregues ao seu destino:. Saddam, Al Assad, Mubarak, Gadafi fazem ou fizeram parte da vida normal deles e representam mais do que um problema, a solução para o tribalismo que carece de tiranias para se manter
O EI declara guerra não apenas à França, ou aos EUA, mas ao modo de vida ocidental. E guerra é guerra… Nossa presidente pediu, na ONU, por inocência ou ignorância, sei lá, que se utilizasse, no conflito com o EI, a diplomacia, ao invés de bombas. Isso não é uma proposta séria. Esses militantes só são capazes de compreender uma única linguagem, escrita e ferro e fogo. A França já vai a campo combatê-los e talvez a coalizão internacional finalmente se amplie e se consolide, com a derrubada daquele Airbus no Sinai, coisa típica deles, aliás. E prometem mais…
Eu entendo a posição do europeu médio, encurralado pelo medo e partidário de xenofobia indiscriminada, temendo a perspectiva de ter o horizonte de suas cidades marcado pelos minaretes das mesquitas e as ruas cheias de mulheres vestidas de charuto…
Nada de diplomacia, negociação ou relativismo cultural. Que se dane o politicamente correto, tão ao gosto do Ocidente (por que lá isso nunca vigorou…). Nada disso funciona para eles. Infelizmente, Amigo, a melhor solução para os fanáticos psicopatas do EI é a promoção de seu encontro com aquelas 40 virgens que lhes prometeu o Profeta. E que façam bom proveito! Maktub!
PS> você que cuida tanto de ser correto politicamente, talvez se espante com estas minhas palavras tão pouco “politicamente corretas”. Prefiro assim, acho que melhor que ser omisso ou pecar por ingenuidade… É bom lembrar: o inimigo do meu inimigo nem sempre será meu amigo…
JOÃO PEREIRA COUTINHO, tudo bem, é considerado um jornalista “de direita”. Eu prefiro chamá-lo de “conservador”, deixando claro que esta é uma posição política que merece respeito. O meu respeito, pelo menos. No artigo seguinte, a respeito dos acontecimentos de Orlando-USA, em junho de 2016, ele está de acordo comigo, ou vice versa… Leiam a seguir.
NA FRENTE DO NARIZ 14/06/2016 02h00
FOLHA DE SÃO PAULO
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É difícil dizer certas coisas. Como lembrava o imortal (e esquerdista) George Orwell, ver a realidade que temos na frente do nariz talvez seja o exercício mais complexo de todos. Mas devemos tentar.
E eu tento: regularmente, nas colunas desta Folha, critico o radicalismo islamita por seu ódio ao “estilo de vida” ocidental. Um ódio que não começou no 11 de Setembro nem com o saudoso Osama Bin Laden.
A história é mais antiga e remonta a finais do século 19, inícios do século 20. Como escreveu o historiador Bernard Lewis, a questão para os muçulmanos passava por saber como explicar o atraso material das suas sociedades quando comparadas com a prosperidade do Ocidente.
E a resposta, na maioria dos casos, não passou por uma análise à fraqueza institucional dessas sociedades e ao papel excessivo da religião nas esferas pública e privada. Como normalmente acontece quando existem complexos de inferioridade, a culpa não era dos próprios. O problema estava nos outros: nos ocidentais que venderam a alma pelo materialismo rasteiro da modernidade.
Agora que penso no assunto, essa também foi a atitude da primeira geração romântica perante o iluminismo continental e, claro, os exércitos napoleônicos. Paris podia representar o “progresso”; mas o verdadeiro progresso que interessava à “intelligentsia” das províncias germânicas era a defesa da “vida interior” e de uma “autenticidade” da existência que passava pela valorização da língua, da cultura, da nação –e, a prazo, do sangue e da raça. Ler Isaiah Berlin é instrutivo sobre a matéria. Mas divago.
Ou não. Porque a resposta da “intelligentsia” islamita ao atraso passou também por uma exaltação da pureza corânica como barreira necessária contra a contaminação ocidental. Uma atitude sem retorno, que se aprofundou violentamente com a desagregação do Império Otomano (depois da Primeira Guerra) e com a dominação “de facto” das potências europeias nas terras do Profeta.
Nos textos de Mawdudi, Hassan al-Banna ou Sayyid Qutb, encontramos sempre essa repulsa ao Ocidente pela revalorização radical da mensagem sagrada.
O caso de Sayyid Qutb, aliás, é exemplar: ele, o principal teórico do islamismo sunita, visitou os Estados Unidos na década de 1950. E, nas páginas que escreveu sobre o viagem, legou um retrato sinistro sobre a “libertinagem” dos nativos. Por “libertinagem”, entenda-se: mulheres com maquiagem, usando minissaia e dançando com o sexo oposto. Qutb testemunhara o inferno e o inferno que ele viu perdurou.
Regularmente, repito, escrevo sobre o ódio islamita ao “estilo de vida” ocidental. E recebo como resposta, para além de insultos rasteiros, o clássico carimbo da “islamofobia”. O terrorismo, quando existe, é sempre culpa dos Estados Unidos, de Israel, da França, do Mickey Mouse e do Pato Donald.
Ou então, em ligeira variação da cegueira, a culpa é das armas que se vendem sem controle, como afirmou Barack Obama depois do massacre da Flórida –o maior ataque terrorista em solo americano desde o 11 de Setembro.
Azar, senhor presidente: os fatos começam a surgir na frente do nosso nariz. Temos um cidadão americano, de origem afegã, que jurou lealdade ao Estado Islâmico. E que escolheu como alvo uma boate gay onde abateu 50 pessoas e feriu 53 (no momento em que escrevo).
Como é evidente, ataques “homofóbicos” acontecem em qualquer lugar (e blablablá). Mas podemos afirmar, sem correr o risco de “islamofobia”, que o tratamento bárbaro que muitos países islâmicos reservam para homossexuais, mulheres adúlteras ou simplesmente “emancipadas” também explica o ódio cultural (e religioso) de Omar Mateen?
Eu sei que, em matéria de “homofobia”, ninguém bate a intolerância da Igreja Católica. Mas será possível sugerir que chicotadas, prisão efetiva ou até enforcamento de homossexuais também deveria merecer mais atenção das brigadas politicamente corretas, que só entram em fúria quando o Papa não abençoa o casamento gay?
Eis a moral da história: quando escrevo sobre o ódio do radicalismo islamita ao “estilo de vida” ocidental, tudo que defendo é esse estilo de vida. Você sabe: o direito a cada um viver como entende, com quem entende, em segurança e liberdade, sem nenhuma punição “sagrada”. O básico. Porque, se fecharmos os olhos ao básico, perderemos muito mais do que o nosso nariz.
Agora é Clovis Rossi que demonstra ideias bem semelhantes às minhas em relação ao islamismo.
O ARCO IRIS E O ISLÂ. FSP 15 DE JUNHO DE 2016
Há um escaninho que só agora começa a ser explorado na catarata de perplexidade gerada pelo atentado homofóbico (e terrorista?) praticado em Orlando.
É o ângulo levantado, com consistência, por David Shariatmadari no “Guardian”: a da possível homossexualidade de Omar Mateen, o assassino, homossexualidade sufocada e reprimida pelas interpretações do islã predominantemente homofóbicas.
Escreve Shariatmadari: “O que dizer das poderosas forças da sexualidade? Da vergonha, do pertencimento, do desejo de arruinar aquilo que você sente que não pode ter “”algumas das mais poderosas forças que a psique contém?”
Ou, em outras palavras, o assassino matou o prazer que gostaria de compartilhar, mas não se sentia autorizado pela prisão virtual imposta pela religião.
O que dá consistência à hipótese são alguns detalhes que emergem do perfil de Mateen e que vão além do fato de ser muçulmano e de seu pai tê-lo retratado homofóbico, os dois primeiros elementos considerados na tragédia.
Primeiro detalhe: Ty Smith, frequentador regular da boate “Pulse”, contou ao jornal “Orlando Sentinel” que cruzou com Mateen umas doze vezes no local. Estaria mapeando a boate para posteriormente atacá-la?
É sempre possível, mas é uma hipótese que se enfraquece quando se sabe que o futuro assassino ficou bêbado mais de uma vez, estado em que o mapeamento de qualquer local fica, obviamente, muito prejudicado ou até inutilizado.
De mais a mais, ficar bêbado não combina com o que se espera de um soldado do islã radical, como Mateen alegou ser. Aliás, tampouco combina com esse perfil o fato de ele ter se gabado, aos colegas de trabalho, de vinculações tanto ao Hizbullah libanês como à Al Qaeda, grupos absolutamente antagônicos.
Segundo detalhe: Maleen era usuário do aplicativo de encontros gays Jack’d, considerado o que mais cresce “para rapazes procurando encontros com rapazes”.
Usou-o para contatos, por exemplo, com Kevin West, outro frequentador regular da boate Pulse.
Tudo somado, portanto, há mais lógica em desconfiar de um homem que não conseguiu sair do armário e resolveu matar frequentadores de um local que ele conhecia do que de um radical islâmico.
Ainda assim, não há como deixar de apontar o dedo para o islã e para sua dificuldade em lidar com a questão da sexualidade (e, claro, do terrorismo).
É o que faz, por exemplo, Bilal Qureshi, ex-editor e produtor da National Public Radio, em artigo para o “The New York Times”.
Primeiro, ele faz a indispensável ressalva de que “nenhuma religião tem o monopólio da homofobia”.
Depois, acrescenta: “Mas, para os muçulmanos, este é também um momento para refletir mais profundamente sobre como nos sentimos a respeito de viver em um país no qual os direitos dos gays são centrais, no qual a igualdade de casamentos é real e a coexistência é o único caminho à frente”.
De fato, suspeito que não adiantam sermões de ocidentais sobre cultura muçulmana. Eles próprios têm de acertar o passo com o mundo moderno.