A vida é essa: descer Bahia, subir Floresta... E já que subiu Floresta, aproveite e vá observar a cidade do alto do Colégio Batista. Velhas casas, velhas ruas, quintais pequenos mas de grande frondes. À frente, a Serra do Curral, emoldurando o cenário de um gigantesco paliteiro. Bonito? Tem sua graça, sempre, esta re-cem-tenária cidade.
Desça agora por uma das ladeiras que vertem na Lagoinha as pessoas, os carros e as fortes enxurradas, quando é tempo delas. Antigo caminho da perdição, hoje apenas passagem de estudantes e comerciários, para a lida brava na metrópole. A Praça Vaz de Mello já não é do povo e sim dos carros, mas a Lagoinha está muito melhor. Quem duvidar que suba Antonio Carlos até a altura do antigo Mercadinho Popular, que reformado virou lugar dos mais ajeitados.
Prossigamos, de taxi, ônibus ou mesmo a pé. O Barro Preto é próximo e vale a pena conhecê-lo. Ali parece que se produz roupa para o mundo, tudo é luz, cor e fashion. Até oficinas mecânicas se travestiram de cinema, espaço cultural, restaurante. Mas, em fins de semana, as ruas tranquilas e arborizadas do Barro Preto ainda permitem vislumbrar um restinho da BH de décadas passadas, nas diversas camadas arquitetônicas que os modismos foram depositando sobre a cidade. São bons exemplos os Grupos Escolares Francisco Sales e Caetano Azeredo, que faziam belo conjunto com o antigo Ginásio Mineiro, depois Colégio Militar, hoje o prédio-sede da Justiça, caído naquele pedaço neoclássico com a sutileza de mil toneladas de concreto. Mas não vale a pena maldizer, não faríamos outra coisa nesta cidade, que está acima desses contrastes e das injunções do lucro imobiliário.
Vamos em frente, pela Av. Barbacena, que até hoje parece instável, quase flutuante, com seu piso irregular, assentada como está sobre um brejo, quem sabe o antigo barro preto. Para os lados da Assembléia, a cidade mostrará sua face moderna quase por inteiro. Mas, procurando bem, vamos ver os belos casarões da burguesia do bairro de Lourdes (alguns nem tanto), já virados em escritórios. O melhor aqui são as ruas e avenidas arborizadas – a Álvares Cabral é marcante – os nossos boulevards, que fazem deste canto da cidade algo sofisticado e cosmopolita. Mais uma vez a Serra do Curral se impõe, um tanto banguela, mas sem perder a majestade.
Pelo Boulevard da Alvares Cabral, subindo e descendo colinas suaves, vai-se ao Parque Municipal, o verdadeiro coração desta cidade. Aqui toda perda, toda dilapidação, toda decadência parece ter passado longe. O Parque não, o Parque continua o mesmo. Aliás, o Parque está cada vez melhor.
Agora é subir Afonso Pena até a antiga Praça do Cruzeiro, nem é preciso ir mais acima. Alí, no sopé do Curral, junto às araucárias da caixa d´água, mirando o horizonte do poente, com as colinas do Santo Antônio e da Barroca ao fundo, é hora de confirmar com os olhos, mas principalmente com o coração, que nenhuma outra cidade é bela como a nossa.