A questão está posta e não comporta outras possibilidades. Dilma só tem três coisas a fazer: resistir e continuar presidente; sair, por força de impeachment; renunciar, por ato voluntário. Não creio que ela se suicide e nem acho que deva fazer isso…
Impeachment é golpe? Há controvérsias… Desde que ele existe, pode ser aplicado e deixa de ser irregular, dizem alguns. Outros, entre os quais me incluo, discordam, inquirindo a respeito dos ´supostos crimes cometidos pela presidente, que aliás ainda não foram comprovados. Crimes graves, digo, não essas pedaladas que todo mundo faz e nem por isso é cassado. No atual estado de coisas, creio que é golpe sim, particularmente dadas as condições em que está sendo executado, a toque de caixa e com julgadores – estes sim – acusados e réus de vários dos crimes que se imputa à presidente, todos sem quaisquer provas até agora.
Resistir, vale a pena? Dilma tem história positiva neste aspecto, tendo resistido com bravura aos interrogatórios e torturas da ditadura. Mas agora não se trata de salvar a pele e nem um punhado de bravos companheiros. O objeto é por demais amplo, constituído que é de todo um país, paralisado, polarizado e em franca regressão econômica, moral e política. E com muitas feras hidrófobas à espreita.
Dilma e seus seguidores certamente dirão: mas não resistir seria admitir nossa culpa. Mas mesmo isso deve ser relativizado agora. O buraco é bem mais abaixo – e maior, incrivelmente maior, também. E certamente apelarão também para razões ideológicas e morais, falando de compromisso feitos com a história do partido e com os desejos de seus eleitores.
Mas aí uma advocacia diabólica se impõe, e faz indagações que não querem se calar. O que sobrou, afinal, dos velhos ideais petistas? Onde está o forte apelo à moralidade pública que já fez os militantes do PT serem comparados a uma “UDN de macacão”? Onde foi parar o senso de autocrítica tão invocado nas vertentes leninistas de esquerda? Onde o ímpeto de controlar os aparelhos de governo, em nome da transparência e da realização do bem comum? Onde a proteção intransigente dos direitos dos trabalhadores, particularmente diante de sua erosão, simbólica e material, dada pelas políticas de ajuste econômico? Onde o apoio social amplo, se não da classe operária, pelo menos de uma classe média intelectualizada?
Se são escassas as respostas do PT para tais questões, sobram justificativas e apelações diversas, contemplando ora a crise internacional, ora a imprensa golpista, com rebarbas para a república de Curitiba, a FIESP, as elites, a classe média, os eleitores de Aécio, a oposição. E por aí vai, muito pouco se fala dos erros do partido e principalmente do atual governo.
O fato é que os velhos ideais parecem ter ficado para trás, perdidos na poeira do caminho tortuoso da política feita a qualquer preço e da preservação da tal “governabilidade”.
Resistir, no cenário atual, presidente, realmente não vale a pena…
O ato de resistir, como já vem sendo praticado nos últimos tempos, mostra bem seus descaminhos, com ministérios, mesmo aqueles que fazem parte das jóias da coroa da esquerda, sendo oferecidos aos políticos fisiológicos, através de barganhas inacreditáveis. Este governo, realmente, já não é governo. Saramago tinha razão quando dizia que preferia não comentar governos, de qualquer país, pois eles nunca estavam onde pareciam estar, mas alhures. O governo do PT, no Brasil, já não é do PT; não é de Dilma; não é de Lula. Muito menos pertence aos muitos cidadãos que confiaram e depositaram seus votos em Dilma, esperando tempos melhores.
Resistir é gesto de exercer algum tipo de poder, mesmo que seja o do estilingue de David contra a truculência de Golias. No caso brasileiro, Golias engoliu David e o digeriu, extraindo dele agora a matéria para sua fome, cuja satisfação é impossível. Como dizia Maiakowsky, eles entraram, pisaram no jardim, mataram o cachorro; agora já não se pode dizer – e fazer – nada! Resistir virou apenas uma alegoria; não estamos na Marquês de Sapucahy…
E vamos caminhando, assim, para o impeachment. Indigno, imoral, injustificado – e mais quantos adjetivos se desejarem. Mas isso, no momento em que escrevo, parece fatalmente irreversível.
Sem outras possibilidades?
Aqui é que entra a hipótese da renúncia, a qual, diga-se de passagem, a presidente diz que não aceita.
Mas seria melhor que Dilma pensasse um pouco mais no assunto…
Primeiro, a renúncia evitaria a humilhação de um impeachment. Ou, pior ainda, do embarque na canoa furada dessa “governabilidade” sem sustentação efetiva e realmente indigna.
Segundo, a renúncia de Dilma e o afastamento do PT do governo levaria o partido voltar a fazer o que de fato ele sabe e faz melhor: OPOSIÇÃO.
Alguns protestarão: mas isso é o mesmo que entregar o poder a Temer, Cunha, Renan…Eu respondo: mas o poder já está, de fato, com eles. Pelo menos vocês petistas farão oposição, saindo da postura de mera defensiva a que estão constrangidos, há muitos meses aliás. E partirão para o ataque, já pensaram, que maravilha!
Sim, só há um cenário melhor do que a renúncia. É o da renúncia seguida de novas eleições. em todos os níveis, de preferência, mas principalmente no nível federal, nos dois poderes sujeitos ao voto popular. Mas isso talvez seja querer demais. Nem Dilma nem o restante da turma que a apoia ou vilipendia parece estar a fim disso,..
Com a modéstia de meu voto, tentei dar ao PT, nas últimas eleições, a chance de voltar a ser oposição. Mas infelizmente não tive sucesso… Mas, quem sabe, em um acesso de lucidez, o PT, desta vez, ofereça esta contribuição à Nação e assim reencontre seu papel histórico?