O documento que ora apresento aos leitores do <veredasaude.com> é o resultado de um Fórum sobre a Saúde no DF, realizado em novembro de 2012, pelo OBSERVATÓRIO DA SAÚDE DO DF, organização civil da qual faço parte.
Saúde no Distrito Federal: o que se constata e o que se sugere
- O QUE SE CONSTATA
São diversos os problemas que interferem no acesso da população aos serviços de saúde no DF, entre eles: a má formação profissional; as deficiências qualitativas e quantitativas de pessoal na saúde; a falta de valorização da Atenção Básica; a baixa resolubilidade e tendência à formação de filas; a deficiente integração entre os serviços de saúde, seja no âmbito do DF ou na relação com o Entorno; a falta de recursos financeiros ou, muitas vezes, sua má gestão; os entraves derivados da Lei de Responsabilidade Fiscal, bem como a politicagem, afetando não só o Conselho de Saúde como a máquina pública em geral.
- Além disso, há que se reconhecer a existência de vazios assistenciais, principalmente nas periferias e no Entorno do DF, com grandes massas da população desassistidas, com particular sofrimento por parte dos mais pobres, que continuam morrendo nas filas dos serviços hospitalares e emergenciais.
- Uma gestão de meios vagarosa e pouco eficiente resulta, quase sempre, em lacunas importantes na prestação de serviços, tendo como exemplo mais pulsante a eterna justificativa de que “o equipamento está quebrado” e a dependência de uma licitação que nunca acontece.
- A situação atual do Conselho de Saúde do DF foi especialmente citada, com ênfase especial em seu “engessamento”, bem como na permeabilidade a influências eleitoreiras e partidárias, além de baixo poder de tomar decisões e fazê-las valer de fato e de direito.
- Questões pendentes que afetam o SUS de modo geral também se fazem presentes no DF, sendo especialmente lembradas: a qualificação técnica; as questões culturais; a baixa utilização de tecnologias de gestão da clinica; o baixo nível de inovações; os problemas decorrentes da precariedade da assistência em centros urbanos; a terceirização de serviços; a falta de sinergia ente as políticas sociais; o baixo nível de informação da população etc.
- O financiamento é aspecto sempre lembrado, face a um panorama de escassez crônica de recursos para a saúde, o que sem dúvida afeta também o DF. Contraditoriamente, entretanto, aqui “sobra” dinheiro em alguns programas, dada a incapacidade de gasto e a existência de normas muito rígidas originadas do Ministério da Saúde.
- A opção de terceirização de serviços por meio de OS e OSCIP, da qual o caso do Hospital de Santa Maria é exemplo emblemático, fracassou no DF, seja por vícios contratuais importantes, seja por incapacidade de regulação e fiscalização por parte do órgão Gestor e do Conselho de Saúde; neste aspecto, há que se considerar, todavia, que o regime de OS constitui uma realidade atual e irreversível na vida pública brasileira e que o grande problema, talvez, não seja sua existência, mas sim o fato notório de que o serviço público não tem estrutura para contratar e fiscalizar tais entidades.
- Deve se prestar especial atenção no recente estudo conjunto realizado pelo Ministério Público, OAB e Conselhos profissionais, com apoio da CNBB, que comprovou o verdadeiro estado de caos na saúde no DF; só na questão de pessoal, comprovou-se um déficit de 50%.
- Aqui como no restante do País não é lícito, por parte dos gestores do SUS, usar o argumento da “responsabilidade fiscal” para justificar sua irresponsabilidade sanitária.
- Especialmente sobre a Secretaria de Saúde do DF um severo diagnóstico foi traçado, nele se incluindo: a administração de RH de feitio amadorístico e não planejada, fazendo que as ações se concentrem em reposição de pessoal e não em necessidades; a subsistência de uma estrutura física, na maioria dos hospitais, defasada e sucateada, com poucas melhorias ao logo dos últimos 25 anos; da mesma forma, a maior parte das unidades de saúde se expandiram sem regras de otimização de suas estruturas; os sistemas de controle e incentivo da força de trabalho são bastante precários (no caso dos médicos, a iniciativa privada paga melhor que o GDF, embora remunere menos às demais profissões); a grande rotatividade de pessoal da linha de frente, acarretando problemas sérios para quem tem a tarefa de organizar o trabalho das equipes, principalmente nas unidades de emergência. Em suma, o grande desafio da saúde no DF está em reestruturar a gestão da saúde, que aqui vem sendo desmantelada há décadas.
- Caso extremo de distorção foi apontado: a realização de um contrato privado para funcionar uma sala de parto de um dos hospitais da rede pública.
- Como fato positivo, aponta-se a criação em anos recentes da Faculdade de Medicina do DF (FEPESC) criada por inspiração em programas docente assistenciais de outras universidades e uma das melhor avaliadas do Brasil, cujos egressos já estão sendo considerados pela sua competência no mercado de trabalho.
- O QUE SE RECOMENDA
Promover ampla reestruturação da Secretaria de Saúde do DF, contemplando com maior ênfase a solução de problemas crônicos relacionados a: administração de RH, de forma a torná-la mais profissional e planejada; superação da mera reposição de pessoal e sua substituição pelo foco nas necessidades dos serviços e da população; melhorias urgentes da estrutura física dos hospitais e demais serviços de saúde; estabelecimento de sistemas de controle e incentivo da força de trabalho; realização de estudos e medidas de gestão para contenção da alta rotatividade de pessoal da linha de frente no sistema; mais agilidade e eficiência na gestão de meios na rede de serviços.
- Em termos do acesso da população aos serviços de saúde, deve-se procurar superar os déficits da formação profissional, bem como as falhas qualitativas e quantitativas de pessoal na saúde; promover a valorização da Atenção Básica, transformando-a em verdadeira porta de entrada e instância coordenadora do sistema de atenção à saúde; incrementar a resolubilidade do sistema e atuar de forma decidida contra as filas, sejam reais ou virtuais (listas de espera); promover a integração entre os serviços de saúde, seja no âmbito do DF ou na relação com o Entorno, com apoio do Governo Federal, superando os trâmites burocráticos e o descompromisso vigentes historicamente; captar mais recursos financeiros junto ao Gestor Federal, superando, ao mesmo tempo, a má gestão e os entraves burocráticos ao gasto efetivo.
- Dinamizar a atuação do Conselho de Saúde do DF, de forma a romper com as influências partidárias, valorizando e incrementando seu poder de tomar decisões e fazê-las valer de fato e de direito.
- Promover medidas de dinamização e modernização do modelo assistencial vigente no DF, com ênfase especial na atenção primária à saúde como instância fundamental de organização e regulação da rede de serviços, contemplando, ao mesmo tempo, um “choque” geral de qualificação técnica; o incremento na utilização de tecnologias de gestão da clinica; o incentivo às verdadeiras inovações assistenciais; a incorporação de tecnologias para atendimento em centros urbanos (flexibilização de horários e locais de atendimento, por exemplo); acautelamento quanto à terceirização de serviços públicos, mas ao mesmo tempo desenvolver capacidades para realizar sua fiscalização e controle; busca de sinergia entre as diversas políticas sociais, além de incremento do nível de informação da população a respeito da saúde.
- Incentivar cada vez mais a formação de médicos e enfermeiros por parte da Faculdade de Medicina do DF (FEPESC), bem como sua atuação na capacitação dos profissionais da rede de serviços, com foco nas necessidades de saúde da população e na política de saúde do DF.
Brasília, março de 2013
FLAIO GOULART, redigiu