Este vai fazer falta: Ferreira Gullar. Sempre gostei dele, mas quando decidiu romper com o dogmatismo esquerdista pra valer, passei a admira-lo mais ainda. Lembro-me, especialmente, de suas investidas contra a política de saúde mental antinosocomial implantada pelo Ministério da Saúde no país. Longe de qualquer unanimidade. Polêmico como sempre, ele apenas lembrou que bastaria ter um esquizofrênico em casa (ele tinha dois) para ver como a pimenta em olhos alheios é apenas colírio. É claro que a militância “psi” não o perdoou – como, aliás, é do feitio das militâncias. Militantes – sabem? – aqueles sujeitos que enxergam o mundo apenas a partir do quadradinho que separam dele e no qual vivem.
Vai aí um grande momento de sua poesia:
Prometi-me possuí-la muito embora
ela me redimisse ou me cegasse.
Busquei-a na catástrofe da aurora,
e na fonte e no muro onde sua face,
entre a alucinação e a paz sonora
da água e do musgo, solitária nasce.
Mas sempre que me acerco vai-se embora
como se me temesse ou me odiasse.
Assim persigo-a, lúcido e demente.
Se por detrás da tarde transparente
seus pés vislumbro, logo nos desvãos
das nuvens fogem, luminosos e ágeis!
Vocabulário e corpo – deuses frágeis –
eu colho a ausência que me queima as mãos.
Bom demais!
Então acertei?