Confesso que ainda não tenho opinião firmada sobre as manifestações de ontem, dia quatro de dezembro de 2016. Assim, no calor do lance, o que vejo é a avaliação de público variar de cinco mil, pela PM de São Paulo, até a mais de 50 mil, pelos organizadores. Já se vê que, pelo menos no lado quantitativo, é melhor não arriscar prognósticos de sucesso – ou não. Ficar calado é a melhor coisa a fazer…
Mas quando vejo as fotos daquelas pessoas nas ruas, de camisa amarela, o que me vem à cabeça em primeiro lugar, é a canção de Chico, Pelas Tabelas (Quando vi todo mundo na rua de blusa amarela / Eu achei que era ela puxando o cordão). Ela, quem, afinal?
Como tudo que o genial Chico faz, a letra possibilita mais de uma interpretação. Ela pode ser um objeto de amor frustrado, puxando um cordão de alegria, enquanto o pobre apaixonado morre em sua tristeza. Pode ser, mas parece que tem mais coisa neste Carnaval…
As referências políticas são óbvias. Há panelas sendo batidas; um homem “que olhava as favelas” (milícia?); o povo que pede a cabeça de alguém.
E o pobre cantor mora no desassossego, com a cabeça em total falta de paz, sendo levada numa baixela justamente por “ela”.
Fico com a segunda hipótese. “Ela”, no caso, deve representar a esperança de tempos melhores. Quem sabe a revolução ou, pelo menos, a redenção de tantas coisas erradas que nos assolam. Ele pensava que era “ela”, mas logo percebe que estava enganado.
Da mesma forma, então, “pelas tabelas”, começo a perceber que o que aquelas pessoas gritavam nas ruas, o objeto de suas aspirações, “ela” afinal, talvez não seja exatamente aquilo que a realidade está mostrando de fato. O que se vê é, mais uma vez, um acordo de elites, a justificativa de combate à corrupção sendo usada para camuflar e escamotear as prerrogativas do estado de direito, que pode não ser lá essas coisas no Brasil, mas é sempre melhor do que uma ditadura.
E eu que vivi os anos de chumbo do governo dos milicos começo a perceber que existem formas mais sutis de ditadura, por exemplo, esta que vem disfarçada de judicialização, de ritos sumários, de “convicção” substituindo investigação e provas, de shows midiáticos protagonizados por juízes e promotores, de leis draconianas que, com a justificativa de combater a corrupção, retiram dos cidadãos, sejam eles bons ou maus, alguns direitos fundamentais.
Lembro-me de Vargas Llosa comentando as décadas do domínio do PRI no México: é a ditadura perfeita; tem tudo de democracia – Congresso, Judiciário, eleições, instituições diversas, mas não passa de uma ditadura, sin más.
De toda forma, a ausência da esquerda neste tipo de protesto demonstra, entre outras possibilidades, uma rejeição ideológica – até aí tudo bem – mas pode também ser pudor de falar de corda quando em casa há gente enforcada…
E salve Ferreira Gullar, que desde há muito tempo chamava nossa atenção para coisas assim.
E aqui vai a letra de Chico Buarque – Pelas Tabelas.
Ando com minha cabeça já pelas tabelas
Claro que ninguém se toca com a minha aflição
Quando vi todo mundo na rua de blusa amarela
Eu achei que era ela puxando o cordão
Oito horas e danço de blusa amarela
Minha cabeça talvez faça as pazes assim
Quando ouvi a cidade de noite batendo as panelas
Eu pensei que era ela voltando pra
Minha cabeça de noite batendo panelas
Provavelmente não deixa a cidade dormir
Quando vi um bocado de gente descendo as favelas
Eu achei que era o povo que vinha pedir
A cabeça de um homem que olhava as favelas
Minha cabeça rolando no Maracanã
Quando vi a galera aplaudindo de pé as tabelas
Eu jurei que era ela que vinha chegando
Com minha cabeça já pelas tabelas
Claro que ninguém se toca com a minha aflição
Quando vi todo mundo na rua de blusa amarela
Eu achei que era ela puxando o cordão
Oito horas e danço de blusa amarela
Minha cabeça talvez faça as pazes assim
Quando ouvi a cidade de noite batendo as panelas
Eu pensei que era ela voltando pra
Minha cabeça de noite batendo panelas
Provavelmente não deixa a cidade dormir
Quando vi um bocado de gente descendo as favelas
Eu achei que era o povo que vinha pedir
A cabeça de um homem que olhava as favelas
Minha cabeça rolando no Maracanã
Quando vi a galera aplaudindo de pé as tabelas
Eu jurei que era ela que vinha chegando
Com minha cabeça já numa baixela
Claro que ninguém se toca com a minha aflição
Quando vi todo mundo na rua de blusa amarela
Eu achei que era ela puxando o cordão
Oito horas e danço de blusa amarela
Minha cabeça talvez faça as pazes assim
Quando ouvi a cidade de noite batendo as panelas
Eu pensei que era ela voltando pra
Minha cabeça de noite batendo panelas
Provavelmente não deixa a cidade dormir
Quando vi um bocado de gente descendo as favelas
Eu achei que era o povo que vinha pedir
A cabeça de um homem que olhava as favelas
Minha cabeça rolando no Maracanã
Quando vi a galera aplaudindo de pé as tabelas
Eu jurei que era ela que vinha chegando
Com minha cabeça já numa baixela
Claro que ninguém se toca com a minha aflição
Quando vi todo mundo na rua de blusa amarela
Eu achei que era ela puxando o cordão
Oito horas e danço de blusa amarela
Minha cabeça talvez faça as pazes assim
Quando ouvi a cidade de noite batendo as panelas
Eu pensei que era ela voltando pra
Minha cabeça de noite batendo panelas
Provavelmente não deixa a cidade dormir
Quando vi um bocado de gente descendo as favelas
Eu achei que era o povo que vinha pedir
A cabeça de um homem que olhava as favelas
Minha cabeça rolando no Maracanã
Quando vi a galera aplaudindo de pé as tabelas
Eu jurei que era ela que vinha chegando
Com minha cabeça já pelas tabelas
Claro que ninguém se toca com a minha aflição
Quando vi todo mundo na rua de blusa amarela