Dilma ex-post facto

GRITO MUNCHJá disse e repito: não votei em Dilma, seja na versão um ou dois. Em Lula, confesso que votei quatro vezes, era a melhor opção. Mas creio que não votaria de novo. Só se fosse, talvez, para derrotar um bolsonaro…

Desisti de Lula não por causa de algum pedalinho ou empréstimo de sítio, apartamento cafona em Guarujá, coisas assim. É que me cansei de suas galhofas e marolas. Oito anos no poder já é o bastante, não adoto o modo bolivariano. Além disso, o cara hoje me parece uma daquelas árvores centenárias, em cuja sombra não cresce nada, com exceção de uns cipós parasitas.

Dilma não mereceu meu voto. Nem seu maior adversário. Detesto gente mandona, professoral, confusa e que tropeça na língua. Se é dada a mentiras, então… nem pensar! Do estelionato eleitoral nem vou falar, mas garanto que já o havia percebido antes. Não sou uma de suas vítimas diretas, apenas fui incomodado como cidadão…

Escrevo no calor da cena final no Senado. Hoje, 31 de agosto de 2016.

Haverá futuro para Dilma? Eu acho que não. Ela agora foi impedida definitivamente, mas mesmo com a manutenção de seus direitos políticos o buraco que ela tem pela frente é escuro e sem fundo… Aliás, penso que o governo da professora já havia se findado desde abril ou maio e escrevi isso aqui nesta mesma época

Parece que não haverá amanhã para o PT… Já é hora, portanto de fazer um balanço dos anos que este Partido comandou  no Brasil. Eu que votei nele nas duas vezes que triunfou no plano nacional, me sinto na obrigação de tentar algo assim, não exatamente um mea culpa, mas uma tentativa de entender o contexto dos meus atos. Sem compromisso, a não ser comigo mesmo, que emprestei meu modesto voto ao projeto petista…

A era luladilma teve acertos? Muitos, eu acho. Mas em matéria de erros foi também insuperável.

Os governos do PT talvez tenham sido simplesmente azarados, na melhor das hipóteses. Talvez desastrados, incompetentes e, na pior das hipóteses, mal-intencionados. A história uma dia revelará a verdade. Por ora o que vejo são conjecturas, inapelavelmente presas à ideologia e à pressa em atacar ou defender. Petralhas versus coxinhas – um dia vamos rir disso tudo. Assim, fico com Yeats, que considerava a dúvida um privilégio dos melhores homens, ao passo que as certezas passionais ficariam com os piores…

Em primeiro lugar, penso que foi importante, depois de um FHC, quebrar o paradigma que o presidente do Brasil tinha que ser um letrado. Lula mostrou que veio para mudar coisas – e muito mudou. Mais tarde é que sua carroça capotou.

Aspecto positivo, embora isso tenha se esvanecido com o tempo, foi o de termos eleições movidas a ideias, não apenas a rancores, pressentimentos, platitudes, vacuidades. Tais fantasmas rondaram o cenário todo o tempo, mas de maneira geral foram superados em 2002, 2006 e 2010. Dona Regina Duarte deve ter tido vontade de ter outra chance para fazer seu famoso discurso. Assim, a esperança venceu o medo e pelo menos por algum tempo nos embriagamos dela, até que o sorvete derreteu.

Renda mínima, que grande acerto! Salve Suplicy, seu legítimo Quixote! Tal ideia se incorporou à política pública, deixando de lado a fragmentação das bolsas disso ou daquilo. Isso abriu as portas também para certas distorções, fazendo com que o Bolsa Família tenha se transformado numa imensa arca, com amplas portas de entrada e quase nenhuma de saída. Enfim, em alguns momentos a política social pareceu se impor ante a política econômica, até que o velho dito – é a Economia, estúpido! – falou mais alto, fazendo o sonho desandar.

Acho que na política externa não fomos mal, como no caso do Haiti. Com Israel o Brasil foi duro, também. Mas não dá para esquecer os tropeços com Ahmadinejadh e com a recomendação risível de Dona Dilma, em plena ONU, que se usasse a diplomacia contra o Estado Islâmico. Boas oportunidades de se ficar calado foram perdidas.

Penso também que a política de ampliação de vagas nas universidades foi correta. Para o ensino básico e profissionalizante, em geral, tenho minhas dúvidas. O tal do Pronatec formou uma multidão de cabeleireiros… Mas, sem dúvida, algumas muralhas corporativas e elitistas foram atacadas e detonadas. Sem retorno.

Mais médicos. A pergunta que não quer calar é: Mais? Do mesmo? Da mesma forma, a questão não esclarecida da sustentabilidade do programa. Mas acho que no geral os resultados foram até positivos, no mínimo por ter representado um pontapé na porta da corporação médica. O que os doutores brasileiros abominam, para mim foi um aspecto bastante positivo. A discussão sobre a interiorização e a periferização da medicina ganhou qualidade e profundidade. Podem colocar o +M entre os acertos deste governo, no meu entendimento.

Ah, o sonho dos grandes projetos de infraestrutura, reunidos sob o pomposo guarda-chuva dos PAC. O problema é que o caminho era mais tortuoso do que se pensava. As empreiteiras espreitavam. O desvio do rio São Francisco ocorreu, mas de forma metafórica, envolvendo canais onde dinheiro sujo era mais abundante do que água limpa. E o PT achou que havia chegado ao paraíso. Mas este era mais em baixo…

Valorizaram-se as minorias e isso teve seu preço. Teve política de saúde até para ciganos, LGBT, “povos do campo e da floresta”. Políticas e programas até para gente que não havia reivindicado nada, salvo para lhes aliviar de serem pobres, tão pobres quanto milhões de outros – mas que novidade há nisso? O petismo se perdeu também por este caminho, ao julgar, equivocadamente, que a soma dos problemas das minorias equivaleria ao grande problema do país.

Na política o desastre foi completo. Acreditaram e investiram em um “presidencialismo de coalizão”, que acabou se transformando em “de ocasião”. E o oportunismo de muitos políticos navegou em águas tranquilas, com Cunha, Renan, Sarney, Jucá e outros tubarões da política à espreita, apenas de boca aberta para que o alimento vivo chegasse. E deu no que deu, não é Katia Abreu?

Penso que se há algo que mesmo os petistas mais amorosos não perdoarão – os mais conscientes pelo menos – é o partido ter se entregue, com tanta volúpia, às práticas que um dia condenou com veemência. Sempre sobrou a desculpa que isso se justificaria pelos benefícios oferecidos à causa dos mais pobres, dos desvalidos, dos excluídos. Ora, Maquiavel já havia tratado de algo assim há mais de cinco séculos, quando falou do manuseio dos fins e dos meios pelo Príncipe. Será que os ideólogos do PT não o leram?

As promessas não cumpridas… Eu juro que não fui enganado; nem acreditei nelas. Mas quando via aquele discurso bonitinho e cor de rosa, na campanha de 2014, dos baixios do meu analfabetismo político, já percebia que algo estava errado e só podia dar no que deu. Estelionato eleitoral é a palavra que define isso, mas podem chamar de propaganda enganosa também.

E a classe média, meu Deus, o que foi feito da classe média? Os mais pobres subiram, os mais ricos lucraram como nunca. Para o segmento do meio, conservador e intimidado como sempre, restou a opção de bater panelas nas janelas, aderir à primeira gritaria, independente de nexo e descer às ruas vestidos com a camiseta da CBF – nada mais apropriado… E nos intervalos dos panelaços, ler a Veja.

Você certamente já foi impedido de trabalhar, viajar ou simplesmente trafegar na sua cidade por força de obstrução nas vias públicas por “movimentos” de todo tipo, não é? Isso o PT não inventou, certamente, mas foi extremamente leniente, transformando o cotidiano de muitos cidadãos em um inferno. Da mesma forma, o grevismo de muitas categorias, principalmente de servidores públicos, às vezes afetando setores essenciais a uma vida social digna, tal como a saúde, a educação, a segurança pública, a previdência social. A síndrome de Eldorado dos Carajás, uma realização tucana, produto de uma polícia que segue mal preparada e que dedica aos cidadãos o estatuto de inimigos em uma guerra, fez da polícia uma mera expectadora da baderna e da usurpação do espaço público, longe de tentar garantir o direito de ir e vir. O problema, longe de ser atenuado, foi cultivado em banho-maria pelos governos petistas e seus estimados associados, os sindicatos de todo naipe (quando isso lhes interessava…). Enfim, a manutenção legítima da ordem pública foi posta em vala comum com o autoritarismo, a repressão, a omissão, a intimidação frente às ameaças dos sindicatos. E nós cidadãos pagamos o pato, além de contribuir, com nossos impostos, para a saúde financeira de tais entidades corporativas.

Convenhamos, o contrato social que um dia a humanidade estabeleceu com a entidade chamada “Estado” não devia dar cobertura aos direitos mínimos? Segurança e movimentação nas cidades não fazem parte de tal cardápio?

Trabalhei no Ministério da Saúde na era Collor e depois Itamar e FHC. Sempre como comissionado, nomeado. Ninguém me pediu carteirinha de filiação partidária (que eu não dispunha, diga-se de passagem). Em anos recentes, qualquer nomeação, mesmo para o enésimo escalão, só sai depois de minucioso exame pela Casa Civil, que analisa, entre outros requisitos o QI (quem indica) do candidato, além da existência de certa carteirinha com a estrela vermelha, ou então de alguma agremiação que tenha indicado o Ministro da vez. E se alguém colocar todas essas carteirinhas da Esplanada, enfileiradas, uma a uma, a fila vai certamente passar de Taprobana – e muito além…

Chega de deblaterar…. O que eu queria dizer é: esse governo teve acertos, mas também cometeu muitas mancadas. Substituí-lo é uma das prerrogativas que a Democracia nos concede. Mas entre tantas opções (impeachment, revolução, golpe militar, anomia social) uma se impõe pela tradição, sendo mesmo corriqueira: ELEIÇÕES. Pena que não rolou.

Mas dois mil e dezoito vem aí, vamos aguardá-lo e deixar o Brasil se mover deste atoleiro em que se encontra, seja por Dilma ou por Temer, tanto faz. O caos só interessa aos bolsonaros.

 

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